Estudo do Evangelho em vídeo, Vídeo

As curas de Jesus e a pesca milagrosa

Há importantes e claros simbolismos na pesca milagrosa e nas curas de Jesus narradas neste capítulo 5 do Evangelho de Lucas. As curas do leproso e do paralítico se referem a importantes estágios da vida do espírito. O episódio conhecido como pesca milagrosa encerra em si numerosos ensinamentos para todos nós. Este é o 6º vídeo de uma série de 30 vídeos em que analiso e interpreto o Evangelho de Lucas baseado no conhecimento proporcionado pelo Espiritismo.

Abaixo você pode ler todo o texto do vídeo.

CAPÍTULO 5

1. E aconteceu que, apertando-o a multidão, para ouvir a palavra de Deus, estava ele junto ao lago de Genesaré;
2. E viu estar dois barcos junto à praia do lago; e os pescadores, havendo descido deles, estavam lavando as redes.
3. E, entrando num dos barcos, que era o de Simão, pediu-lhe que o afastasse um pouco da terra; e, assentando-se, ensinava do barco a multidão.
4. E, quando acabou de falar, disse a Simão: Faze-te ao mar alto, e lançai as vossas redes para pescar.
5. E, respondendo Simão, disse-lhe: Mestre, havendo trabalhado toda a noite, nada apanhamos; mas, sobre a tua palavra, lançarei a rede.
6. E, fazendo assim, colheram uma grande quantidade de peixes, e rompia-se-lhes a rede.
7. E fizeram sinal aos companheiros que estavam no outro barco, para que os fossem ajudar. E foram, e encheram ambos os barcos, de maneira tal que quase iam a pique.
8. E vendo isto Simão Pedro, prostrou-se aos pés de Jesus, dizendo: Senhor, ausenta-te de mim, que sou um homem pecador.
9. Pois que o espanto se apoderara dele, e de todos os que com ele estavam, por causa da pesca de peixe que haviam feito.
10. E, de igual modo, também de Tiago e João, filhos de Zebedeu, que eram companheiros de Simão. E disse Jesus a Simão: Não temas; de agora em diante serás pescador de homens.
11. E, levando os barcos para terra, deixaram tudo, e o seguiram.

Jesus estava na beira do lago e a multidão à sua volta, apertando-o contra o lago. Havia dois barcos ali perto, os pescadores tinham descido e estavam lavando as redes de pesca. Jesus entra num dos barcos, que era o barco de Pedro, pede pra Pedro afastar o barco um pouco e começa a ensinar a multidão dali mesmo, de dentro do barco.

Quando Jesus terminou de ensinar, disse a Pedro que fosse em direção ao meio do lago, onde ele era mais fundo, e que lançasse as redes de lá, para pescar. Pedro, que era um pescador experiente, respondeu a Jesus que ele e os seus companheiros haviam trabalhado a noite inteira e não tinham pegado nada; mas, como Jesus estava pedindo, ele ia obedecer.

Pedro jogou a rede e a recolheu com tantos peixes que a rede se rompia. Pediu que os seus companheiros que estavam no outro barco viessem ajudar; eles vieram e ajudaram.

Eles encheram os dois barcos de peixes e os barcos quase afundavam com o peso. Quando Pedro viu isso ele se jogou aos pés de Jesus, em sinal de humildade, e disse:

Senhor, ausenta-te de mim, que sou um homem pecador”.Pedro ficou assombrado com aquilo. Não só ele como Tiago e João, que eram seus sócios. Nunca tinham visto nada assim.

E então Jesus disse a Pedro: Não temas; de agora em diante serás pescador de homens”.Então eles deixaram tudo e seguiram Jesus.

Esses foram os primeiros apóstolos de Jesus. Pedro e seu irmão André, e João e seu irmão Tiago. Certamente todos já conheciam Jesus. Faltava alguma coisa que os convencesse a segui-lo. E este acontecimento da pesca foi determinante.Temos muitas lições a aproveitar deste episódio.

Jesus diz a Pedro, que era pescador, que agora ele seria pescador de homens. Ao mesmo tempo em que Jesus utilizou-se dessa pesca fenomenal para convencer os seus quatro primeiros discípulos a segui-lo, ele deixou para nós um aviso importante que, infelizmente, poucos seguem.

A pesca provocada por ele simboliza justamente a pesca de homens. Essa pesca é a pesca de homens, os peixes simbolizam os homens.

O nome de Pedro é Simão. Jesus é que o chama de Pedro, que quer dizer pedra. Pedro é a base, ou seja, é a tradição. Pedro é o símbolo da religião tradicional, pois a religião tradicional tem seu fundamento nos dez mandamentos, as chamadas tábuas da lei, leis que foram escritas em pedra.

Pedro, que os católicos consideram como o primeiro papa, e como o fundador da sua Igreja, não consegue dar conta do recado sozinho. São muitos homens pescados por ele, a rede está-se rompendo e ele precisa de ajuda, precisa que os seus companheiros de “pesca de homens” o ajudem, peguem metade dos homens para si, para o seu barco.

Nós vemos que Jesus ensinava no barco de Pedro. Mas este lugar de Pedro em que Jesus ensinava não tinha mais espaço para tantos homens, por isso foi pedido aos companheiros de outro barco, de outro lugar de ensino -já que Jesus ensinou no barco – que levassem muitos homens também para o seu lugar de ensino.

Nós vimos que a rede de Pedro se rompia. Romper ou rasgar vem do grego “cisma”. E cisma é exatamente a separação dentro de um movimento religioso.

Mas, ao contrário do que normalmente ocorre, em que a separação acontece por vaidades ou disputas de poder, aqui é o próprio Pedro quem pede para que o outro possível lugar de ensino, o outro barco, acolha também muitos homens, muitos peixes que representam homens, segundo o que disse Jesus a Pedro.

Essa lição é clara. Pedro e seus companheiros são pescadores de homens, tiravam peixes da água, da vida para a morte; agora tiram homens da água, simbolizando a reencarnação ou a vida após o mergulho para dentro de si mesmo para a conscientização e o resgate do carma, a libertação dos erros, o abandono da vida de erros, o mergulho que era pregado por João Batista .

Pedro é pescador de homens e não se importa de dividir os homens com seus companheiros, pelo contrário; pede a sua ajuda para que nenhum homem se perca.

Assim deve ser com respeito às religiões. Cada religião ou igreja deve ficar feliz de saber que as outras denominações religiosas estão cheias. Isso vale para o Espiritismo, ou o chamado “movimento espírita”. Em vez de ficar criticando a adoção de determinados autores ou práticas diferentes das suas, todos devem ficar contentes em saber que os grandes ensinamentos cristãos e os princípios básicos do Espiritismo estão sendo adotados por muitas pessoas.

É bom lembrar que quando o apóstolo João encontrou um homem expulsando espíritos obsessores em nome de Jesus, e foi correndo contar para Jesus que havia proibido o homem de fazer isso, Jesus disse a ele que não deveria proibir, pois quem pratica obras poderosas em seu nome não pode representar mal a Jesus (Lucas 9:49-50). Quem não é contra nós é por nós.

Mas nós encontramos outra lição importante neste episódio da pesca. Pedro passou a noite inteira pescando, sem capturar nada na rede. A noite inteira de esforço em vão. Pedro não encontrou o que estava buscando, embora tenha gasto a noite inteira nisso.

Depois que desistiu da sua busca sem o Cristo, quando voltou ao local da busca com o Cristo, e depois de ter ouvido o ensino do Cristo, e depois de ter obedecido o  Cristo, e de ter se afastado da margem, de ter ido até onde era profundo, Pedro encontrou o que buscava, e muito mais do que isso, tanto que ainda repartiu o que encontrou com os seus companheiros.

Assim somos nós em nossas longas noites de insônia, em que buscamos respostas a partir dos nossos parcos conhecimentos, que são as águas rasas, e não as encontramos.

Mas quando refazemos a busca por respostas não mais apenas contando com os nossos conhecimentos e experiências, mas com o Cristo, ouvindo o Cristo, nos afastamos da superfície, nos afastamos da superficialidade, vamos onde o Cristo nos aponta, onde é profundo, e então encontramos o que estávamos buscando há tanto tempo em vão.

Aprendemos também a confiança no Cristo, o valor da obediência, que pressupõe disciplina; o abandono das coisas de menor importância para ir em busca do que realmente importa.

Pedro e seus companheiros haviam atingido o auge da sua profissão, haviam realizado a maior pesca de suas vidas, e não hesitaram em abandonar os peixes para irem em busca de homens. Deixaram o que era menos importante para irem em busca do que é realmente importante.

Isso não quer dizer, de modo algum, que nós devemos abandonar o nosso trabalho para sair pregando por aí. Pelo contrário. Devemos viver às nossas próprias custas, com o fruto do nosso próprio trabalho. Mas devemos deixar de lado as futilidades e os passatempos inúteis e nos esclarecermos espiritualmente.

12. E aconteceu que, quando estava numa daquelas cidades, eis que um homem cheio de lepra, vendo a Jesus, prostrou-se sobre o rosto, e rogou-lhe, dizendo: Senhor, se quiseres, bem podes limpar-me.
13. E ele, estendendo a mão, tocou-lhe, dizendo: Quero, sê limpo. E logo a lepra desapareceu dele.
14. E ordenou-lhe que a ninguém o dissesse. Mas vai, disse, mostra-te ao sacerdote, e oferece pela tua purificação, o que Moisés determinou para que lhes sirva de testemunho.
15. A sua fama, porém, se propagava ainda mais, e ajuntava-se muita gente para o ouvir e para ser por ele curada das suas enfermidades.
16. Ele, porém, retirava-se para os desertos, e ali orava.

A lepra, para o povo em que Jesus nasceu e viveu, era tida como uma desgraça, uma desonra, era associada ao erro, à impureza espiritual. O que eles chamavam de lepra englobava várias doenças de pele, transmissíveis ou não. Consideravam essas doenças muito contagiosas, por isso as temiam tanto.

Os leprosos viviam afastados da sociedade, em locais desertos, e deviam avisar a quem passasse de longe a sua situação de leprosos, para que ninguém se aproximasse deles.

Mas o leproso aproximou-se, se prosternou-se no chão, se abaixou e disse Jesus: Senhor, se quiseres, bem podes limpar-me”.  Na tradução do Haroldo Dutra Dias encontramos a expressão mais adequada: – “Senhor, se quiseres, podes purificar-me”. Jesus, estendendo a mão, tocou-lhe dizendo: “Quero! Seja purificado!” E imediatamente a lepra afastou-se dele.

Vemos que ele não pede para ser curado da lepra, mas pede para ser purificado, justamente porque a lepra tinha essa conotação de doença do espírito, de mal moral.

Era proibido, para qualquer pessoa, aproximar-se de um leproso. O leproso era considerado impuro, e quem tocasse num leproso também se tornava impuro, era considerado legalmente impuro.

Mas Jesus tocou no leproso e, em vez de se tornar legalmente impuro, foi ele que purificou espiritualmente o leproso. Não foi ele que se contaminou com a impureza do leproso, mas foi o leproso que se contaminou com a pureza de Jesus.

Foi Jesus quem curou o leproso? Ou o leproso já havia esgotado o seu carma, já havia deixado para trás a sua vida de erros e precisava purificar-se espiritualmente para reintegrar-se à vida?

O leproso, depois de muito sofrer, tornou-se humilde. Isso não quer dizer, de modo algum, que o sofrimento seja necessário para desenvolver a humildade. Aliás, a dor é inevitável, mas o sofrimento, não. Duas pessoas podem experimentar exatamente o mesmo mal e uma delas sofrer em conseqüência deste mal e a outra não. Isso depende da postura da pessoa em relação à dor.

Acontece que até uma criança respeita a dor como mecanismo de retificação. Uma criança que leva um choque porque enfiou o dedo na tomada não vai tornar a enfiar o dedo na tomada. A dor ensina. A dor moral nos mostra que as atitudes que tomamos e que nos levaram a sentir dor não estão corretas.

Pois foi isso que aconteceu com o leproso. Através da dor ele reconheceu a sua impureza espiritual, estava espiritualmente isolado, sem contato com a humanidade.

Mas a doença é do espírito. O corpo apenas reflete ou purga a impureza do espírito em forma de doença. Por isso Jesus não cura o leproso, mas o purifica. O leproso já havia abandonado os seus erros, faltava a conscientização da sua origem divina, da existência do Cristo interno, e isso ele conquista com Jesus.

Depois de limpo ou purificado, Jesus diz ao ex-leproso para ele não contar nada a ninguém e para apresentar-se ao sacerdote e fazer a oferta pela sua purificação, de acordo com o que ordenava a lei de Moisés, para servir de testemunho aos sacerdotes.

Todos que se curavam deviam oferecer um sacrifício, conforme prescrevia a lei religiosa da época, para que ele fosse considerado legalmente puro e pudesse ser reintegrado à sociedade e à sua religião.

Jesus respeitava a religião da época. Isso mostra que ele não veio fundar nenhuma religião.

Várias vezes, depois de curar alguém, Jesus pede segredo. Muitos comentadores do Evangelho atribuem esse pedido de discrição ao que chamam de “segredo messiânico”.

Concordamos, pelo menos em parte. Acreditamos que Jesus tinha toda a sua missão planejada e não podia precipitar os fatos. Quanto menos ele chamasse a atenção das autoridades, melhor, pois muitos a essa altura já queriam vê-lo desaparecido.

Mas parece, também, como já comentamos, que ele nos deixa como lição a modéstia, o perigo que representa a vaidade, a vaidade que nasce dos elogios e da aclamação pública.

Há outro motivo importante para que Jesus pedisse que não contassem de suas curas. Essas curas se davam em pessoas (espíritos) que, possivelmente, já haviam resgatado os seus erros, ou que, pelo menos, estavam dispostos a repará-los. Se eles já tinham resgatado os seus erros, ou se estavam dispostos a repará-los, por que estavam doentes?

Porque estavam cristalizados na dor e na impotência. Depois de tanto tempo de sofrimento, faltava-lhes a confiança necessária. Essa confiança só seria adquirida pelo seu contato com o Cristo.

Mas para quem estava recém começando a reconhecer o Cristo, para quem estava desenvolvendo a confiança, a descrença e a maledicência alheias poderiam lhes abalar. Ao sair contando de suas curas aos descrentes e aos ignorantes, estes não acreditariam num cura verdadeira; diriam, repetindo letras mortas de livros velhos, que isso era impossível; e essa descrença, esse negativismo poderiam abalar o espírito recém-liberto.

Isso acontece hoje ainda. Sempre existem pessoas infelizes com crenças arraigadas no diabo, pessoas que acreditam muito mais em diabos e capetas do que em Deus, e que estão prontas para despejarem o seu negativismo em quem se declarar curado ou purificado por um meio que não seja a sua religião ou igreja.

De qualquer modo, esses pedidos de segredo não surtiam efeito, porque cada vez mais as multidões o seguiam, levando os enfermos para serem curados.

***

Lucas acrescenta, como em outras vezes, que Jesus estava se retirando para os desertos (lugares ermos) e orando. Sempre vemos o valor que Jesus dava à oração, pelo seu próprio exemplo. Não à oração cheia de palavras e gestos, mas ao recolhimento ao deserto, aos lugares ermos, ou seja, solitariamente, de si para consigo, buscando o Cristo interno que habita em cada um de nós.

17. E aconteceu que, num daqueles dias, estava ensinando, e estavam ali assentados fariseus e doutores da lei, que tinham vindo de todas as aldeias da Galiléia, e da Judéia, e de Jerusalém. E a virtude do Senhor estava ali para os curar.
18. E eis que uns homens transportaram numa cama um homem que estava paralítico, e procuravam fazê-lo entrar e pô-lo diante dele.

19. E, não achando por onde o pudessem levar, por causa da multidão, subiram ao telhado, e por entre as telhas o baixaram com a cama, até ao meio, diante de Jesus.
20. E, vendo ele a fé deles, disse-lhe: Homem, os teus pecados te são perdoados.
21. E os escribas e os fariseus começaram a arrazoar, dizendo: Quem é este que diz blasfêmias? Quem pode perdoar pecados, senão só Deus?
22. Jesus, porém, conhecendo os seus pensamentos, respondeu, e disse-lhes: Que arrazoais em vossos corações?
23. Qual é mais fácil? dizer: Os teus pecados te são perdoados; ou dizer: Levanta-te, e anda?
24. Ora, para que saibais que o Filho do homem tem sobre a terra poder de perdoar pecados (disse ao paralítico), a ti te digo: Levanta-te, toma a tua cama, e vai para tua casa.
25. E, levantando-se logo diante deles, e tomando a cama em que estava deitado, foi para sua casa, glorificando a Deus.
26. E todos ficaram maravilhados, e glorificaram a Deus; e ficaram cheios de temor, dizendo: Hoje vimos prodígios.

Jesus estava provavelmente na casa de Pedro, que é onde ele morava quando estava em Cafarnaum, e havia lá fariseus e doutores da lei vindos de todas as aldeias.

Os fariseus formavam um grupo religioso e em parte político, já que religião e política muitas vezes se misturavam para aquele povo; aliás, isso perdura até hoje no Oriente Médio.

A palavra fariseu quer dizer “separado”. Eles mantinham-se até certo ponto separados do resto da população porque davam muita importância à Torá, o livro sagrado dos judeus (correspondente ao Pentateuco da Bíblia) e às tradições. Levavam tudo ao pé da letra, eram muito rigorosos, cheios de regras, sufocavam a população com tantas regras de pureza.

O que pode ter começado como boa intenção, como uma tentativa de zelo pelos valores que defendiam, acabou virando uma obsessão.

Ainda hoje está cheio de novos fariseus por aí. Religiosos que cuidam apenas das exterioridades, das aparências, da letra morta da Bíblia, sem perceberem o que está por trás da letra e sem cuidarem do seu íntimo.

Os doutores da lei, ou mestres da lei, também chamados de escribas, eram aqueles estudiosos da Torá, que pelo conhecimento que tinham do seu livro sagrado eram autorizados a determinar normas de conduta.

***

Havia muitos fariseus e doutores da lei na casa de Pedro, onde estava Jesus – interditando a porta, em volta da casa, impossibilitando que alguém passasse. Nisso chegaram quatro homens trazendo um paralítico numa cama (maca, padiola), para colocá-lo na frente de Jesus.

Como não conseguiram passar, subiram ao telhado – os telhados das casas eram lisos, como terraços, as pessoas ficavam normalmente sobre o telhado das casas, ou mesmo caminhavam sobre os telhados.

Subiram ao telhado com o paralítico, abriram um buraco no teto e desceram o paralítico na sua maca em frente a Jesus. Jesus, vendo a fé deles, disse: Homem, os teus pecados te são perdoados”. Já vimos que isso equivale a dizer “os teus erros foram resgatados”, ou “os teus erros foram deixados para trás”, ou “estás libertado dos teus erros”.

Ao nos depararmos com a expressão “os teus pecados foram perdoados” podemos ter a impressão de que o desligamento, a libertação dos nossos erros depende de Jesus. Jesus é nosso modelo e guia, é seguindo o seu ensinamento que nos libertamos dos erros. Mas a libertação compete a nós mesmos. “A cada um segundo as suas obras”.

Quando Jesus disse isso ao paralítico, os escribas e os fariseus ficaram enlouquecidos. Achavam que o que Jesus disse era uma blasfêmia, pois os judeus associavam a doença aos erros cometidos, às impurezas do espírito, e acreditavam que só Deus pode “perdoar os pecados”.

Mas Deus não age diretamente sobre nós. Deus age através de suas Leis cósmicas eternas, entre elas a Lei de causa e efeito, segundo a qual nós colhemos aquilo que plantamos. Somos nós que acionamos as Leis de Deus ao agirmos. Nossa ação e suas consequências estão subordinadas às Leis de Deus.

Mas os escribas e fariseus consideraram as palavras de Jesus uma blasfêmia, pois Jesus declarou que os erros do paralítico haviam ficado para trás, e eles achavam que essa declaração competia exclusivamente a Deus.

Jesus leu os seus pensamentos, num fenômeno avançado de telepatia, o que ele sempre fazia, graças à sua grande superioridade espiritual, e perguntou-lhes: “Qual é mais fácil? dizer: Os teus pecados te são perdoados; ou dizer: Levanta-te, e anda? Ora, para que saibais que o Filho do homem tem sobre a terra poder de perdoar pecados (disse ao paralítico), a ti te digo: Levanta-te, toma a tua cama, e vai para tua casa”.

Jesus não disse ao paralítico que ele estava curado. Jesus declarou que os erros do paralítico haviam ficado para trás, que ele estava libertado dos seus erros, que ele não era mais escravo dos seus erros passados.

Como consequência deste fato e da sua declaração, através do incalculável poder magnético de Jesus, o corpo físico sofreu a consequência da libertação espiritual e ficou curado.

Lucas chama a atenção para o fato de que em Jesus, naquela ocasião, a virtude do Senhor estava ali para os curar. A palavra grega traduzida como  virtude é dynamis (δυναμις), que quer dizer “poder”. Havia, então, poder do Senhor para ele curar”.

Se hoje nós vemos pessoas de diversas correntes religiosas, ou mesmo sem religião, capazes de promover curas, no que o Espiritismo denomina de mediunidade de cura, imagine o que devia ser o poder de Jesus!

Mas o que ressalta desta passagem não é o aspecto material, que é apenas consequência. Os fatos materiais foram provocados por Jesus para que os seus simbolismos ficassem gravados para a posteridade. O importante é o aspecto espiritual.

O paralítico é o espírito estagnado, que depois de muito errar e de muito sofrer as consequências dos seus atos, perdeu a tal ponto a iniciativa, o dinamismo, que está paralisado, estagnado evolutivamente. Mas despertou para o Cristo, busca o Cristo, supera todos os obstáculos e se renova. Seus erros foram deixados para trás, ele pode recomeçar.

Jesus diz para ele levantar-se, pegar a sua cama e ir para casa. É o mesmo que dizer ao espírito arrependido e ansioso por recomeçar: – “Saia da estagnação, carregue o seu corpo físico e vá para o mundo físico, reencarne”.

Jesus manda o paralítico carregar a cama. Isso tanto pode representar o corpo físico, que ficou curado porque o espírito se libertou dos seus erros, assumindo nova postura, como também pode representar o passado do homem, o passado em que ele vivia apoiado, que já não é necessário para ele apoiar-se, mas que deve ser carregado, ainda, como lembrança do que lhe aconteceu, como uma bagagem espiritual.

***

Nestas duas curas, do leproso e do paralítico, vemos que primeiro houve a purificação do espírito e depois a cura do corpo físico.

O físico é consequência do espiritual. A causa é o espírito, o efeito é o corpo.

A fé, para o leproso e o paralítico, representa ação. Não é crença, é ação.

27. E, depois disto, saiu, e viu um publicano, chamado Levi, assentado na recebedoria, e disse-lhe: Segue-me.
28. E ele, deixando tudo, levantou-se e o seguiu.
29. E fez-lhe Levi um grande banquete em sua casa; e havia ali uma multidão de publicanos e outros que estavam com eles à mesa.
30. E os escribas deles, e os fariseus, murmuravam contra os seus discípulos, dizendo: Por que comeis e bebeis com publicanos e pecadores?
31. E Jesus, respondendo, disse-lhes: Não necessitam de médico os que estão sãos, mas, sim, os que estão enfermos;
32. Eu não vim chamar os justos, mas, sim, os pecadores, ao arrependimento.

Esse publicano era Mateus, também chamado Levi. Jesus falou para ele o seguir e ele o seguiu e se tornou apóstolo de Jesus, um dos evangelistas.

Mateus era um homem culto para a sua época – no mínimo era alfabetizado, coisa que a maioria não era. Mateus não pensou duas vezes. Levantou-se e seguiu Jesus. Mateus e a sua atitude representam todo aquele que ouve o chamado do seu Cristo interno e o segue sem hesitação, deixando para trás a procura por bens materiais – já que esta era a função de Mateus, cobrar impostos, recolher dinheiro – e seguindo o caminho do Cristo.

Mateus ofereceu um grande banquete a Jesus, e neste banquete estavam muitos publicanos, colegas – ou, agora, ex-colegas de profissão de Mateus. E Jesus estava lá, no meio deles. Isso equivaleria, hoje, a comparecer a um jantar com os piores políticos, com os currículos mais perversos de Brasília. Os fariseus viram aquilo e intimaram Jesus: – Como é que ele comia com publicanos e pecadores?

Jesus então respondeu: Não necessitam de médico os que estão sãos, mas, sim, os que estão enfermos; eu não vim chamar os justos, mas, sim, os pecadores, ao arrependimento”.   

Para os fariseus, que seguiam a lei ao pé da letra, que não eram capazes de buscar o significado do que estava escrito nas escrituras, Jesus estava se contaminado com a impureza dos publicanos.

Os fariseus modernos de hoje também buscam passagens obscuras da Bíblia para justificar absurdos ou condenar o que não compreendem. Continuam apegados à letra. Não seguem o conselho do apóstolo Paulo que diz que o espírito dá a vida, mas a letra mata (2 Cor 3:6).

Assim como Jesus não se contaminou com a lepra, não se contaminaria com a companhia dos publicanos, pelo contrário. Exerceria a sua influência poderosa sobre eles.

***

Jesus, que é Jesus, enquanto esteve encarnado não escolheu pessoas com quem conversar e dividir as refeições. E temos hoje pretensos representantes de Jesus que se referem aos que não seguem sua igreja como “ímpios”.

33. Disseram-lhe, então, eles: Por que jejuam os discípulos de João muitas vezes, e fazem orações, como também os dos fariseus, mas os teus comem e bebem?
34. E ele lhes disse: Podeis vós fazer jejuar os filhos das bodas, enquanto o esposo está com eles?
35. Dias virão, porém, em que o esposo lhes será tirado, e então, naqueles dias, jejuarão.
36. E disse-lhes também uma parábola: Ninguém deita um pedaço de uma roupa nova para a coser em roupa velha, pois romperá a nova e o remendo não condiz com a velha.
37. E ninguém deita vinho novo em odres velhos; de outra sorte o vinho novo romperá os odres, e entornar-se-á o vinho, e os odres se estragarão;
38. Mas o vinho novo deve deitar-se em odres novos, e ambos juntamente se conservarão.
39. E ninguém tendo bebido o velho quer logo o novo, porque diz: Melhor é o velho.

Os fariseus jejuavam determinados dias, seguiam isso como um ritual. Não jejuavam para se purificar, para facilitar a meditação, mas apenas para cumprir a rigidez da lei e das tradições.

Os discípulos de João Batista também jejuavam, achavam que a prática do jejum elevava o espírito, e é verdade que o jejum facilita, pelo menos algumas vezes, o contato com a espiritualidade superior.

Mas o jejum aqui representa a abstenção de prazeres ou a fuga da materialidade.

Jesus diz que os seus discípulos não poderiam jejuar enquanto ele estivesse com eles, mas que um dia, quando ele fosse retirado dos seus discípulos, então eles jejuariam, ou “se absteriam de prazeres materiais”.

Jesus, alegoricamente, chama a si mesmo de “o esposo”, ou “o noivo”. O noivo, nos dias de festa do casamento, era a figura mais importante. Para um povo simples e sem grandes recursos culturais, a maior alegria, sem dúvida, era a festa de casamento. Para a maioria o casamento era a única ocasião de festa alegre.

Muitas interpretações têm sido dadas a essas parábolas de Jesus. Primeiro vamos esclarecer o objeto das parábolas.

Não se põe “vinho novo em odres velhos”. Odre é um recipiente, geralmente de pele de cabra, para se guardar o vinho. Uma espécie de cantil. Com o tempo de uso, a pele cedia e ficava quebradiça. O vinho novo não poderia ser acomodado num odre velho, pois o vinho ainda produziria gases, se expandiria e o odre se romperia. Estragaria o odre e se perderia o vinho.

Não se põe pedaço de uma roupa nova para a coser em roupa velha”. O remendo novo se refere ao tecido cru, ao tecido não lavado, que ainda iria encolher. Se pusermos remendo de pano novo em roupa velha, estraga-se o pano novo e rasga-se a roupa velha, pois o pano novo encolhe e rompe o tecido velho.

O odre velho é o velho sistema religioso, tradicional, dogmático, que cuida das exterioridades, que interpreta tudo ao pé da letra.

O vinho novo é o espírito renovado, o espírito que se conscientizou, o espírito que evoluiu e precisa de novidade, e para isso ainda vai se expandir, assim como o vinho novo que se expande porque produz gases. O vinho novo é o espírito que não fica estagnado, que incorpora novos conceitos, que aprende coisas novas, que não suporta dogmatismos.

O espírito renovado precisa de um sistema novo, assim como o vinho novo precisa de um odre novo. Colocar o vinho novo no odre velho rompe o odre velho, e os dois se perdem.

Nós vimos no começo deste capítulo que a rede de Pedro se rompia, e ele precisou de ajuda, ele mesmo pediu ajuda, para que nada se perdesse.

Assim como a rede de Pedro é o odre velho. É o sistema velho. Jesus nos orienta, então, para respeitarmos as características de cada espírito, sem tentarmos adaptar forçosamente o espírito do homem novo no sistema velho.

Colocar o espírito renovado, o espírito do homem novo (de que nos fala o apóstolo Paulo) no sistema velho, irá romper o sistema velho e perder o espírito novo.

Rompe-se o sistema velho por ver-se ultrapassado e incapaz de conter as novas descobertas que a evolução nos apresentou; e perde-se o espírito novo por não encontrar acolhida segura no sistema velho.

É o que acontece com tantos espíritos inteligentes e cheios de boas intenções que só conhecem as religiões dogmáticas tradicionais e se desiludem com a rigidez e a ideia equivocada de Deus, optando pelo ateísmo.

O espírito novo, ou homem novo, precisa de um sistema novo, que evolua junto com ele, que não se prenda a dogmas e convenções sociais. Os dogmáticos estão em toda parte. Até dentro do Espiritismo há os dogmáticos.

A parábola do remendo de pano novo em veste velha tem o mesmo sentido; apenas devemos acrescentar que a roupa nos reveste, exteriormente, representando o corpo físico, e o vinho fica no interior do odre, representando o espírito.

Então essa interpretação da parábola se aplica tanto à matéria como ao espírito.

Nada impede que o espírito acostumado ao sistema velho se expanda em conhecimentos e experiências e entre no sistema novo.

Mas o espírito do homem novo não pode acomodar-se ao sistema velho, pois o sistema velho não pode contê-lo: os dois se perderiam.

***

– No episódio da pesca nós vimos que, com Jesus, os homens têm a capacidade de “pescar” ou conquistar outros homens para as verdades espirituais, mas isso não deve ser feito exclusivamente por alguém ou por um grupo, mas deve ser compartilhado, ou “a rede se rompe”;

– Com a cura do leproso nós vimos que esse pesca de homens ou essa conquista dos homens para a espiritualidade purifica o espírito;

– Com a cura do paralítico, vimos que o espírito sai da estagnação e recomeça a movimentar-se por si mesmo, a andar com as suas próprias pernas;

– Com a chamada de Mateus vemos que qualquer um pode regenerar-se e seguir o Cristo;

– E com as parábolas do vinho e do pano, concluímos que tudo evolui e que o pensamento dogmático estagnado não comporta o espírito que se expande em conhecimentos e experiências.

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